A Ascensão e Queda da Política do Antiestablishment
Antes de começar qualquer tipo de análise ou reflexão, gostaria de enfatizar que não sou cientista político, analista político, não possuo qualquer tipo de formação em ciências humanas e nem pretendo expor um posicionamento político. No entanto, como analista financeiro e estudioso de movimentos do mercado é meu trabalho realizar previsões para melhor posicionar minhas teses de investimento e maximizar o retorno do portfólio. No ano de 2022, vivemos no Brasil a mais complexa e calorosa disputa eleitoral desde a redemocratização e, para muitos, o resultado pode ter sido uma surpresa, porém se analisarmos atentamente as ondas políticas da última década, o terceiro mandato de Lula era previsível. Isso ocorre pela ascensão e queda de um movimento político que chamarei neste texto de Política do Antiestablishment.
Nos anos de 2015 e 2016, o mundo passava por uma onda geral de descontamento com os políticos tradicionais, seja por ineficiência das políticas públicas adotadas ou pelos diversos escândalos de corrupção que ainda horrorizam a população. Nestes dois anos, vivenciamos 3 eleições que iniciaram o que podemos de chamar de Política do Antiestablishment: eleição presidencial Argentina (2015), eleição presidencial nos EUA (2016) e eleição municipal de São Paulo (2016). Os três vencedores destes pleitos possuem diversas características distintas, mas suas semelhanças são inegáveis: empresários bem sucedidos, pouca tradição política, orientação econômica à direita e, principalmente, um discurso de ruptura com a velha política. São eles respectivamente: Maurício Macri (Argentina), Donald Trump (EUA) e João Dória (SP). No caso do americano e do brasileiro ainda há uma semelhança maior, ambos apresentaram o mesmo programa na televisão de seus países, “O Aprendiz”. A ascensão desta classe de políticos pouco tradicionais ao poder ocorreu de maneira rápida e, em poucos anos, os principais cargos de liderança política no mundo eram ocupados por pessoas alinhadas ao discurso de ruptura. No Brasil, esse movimento foi consolidado em 2018 quando o capitão reformado Jair Bolsonaro derrotou Fernando Haddad e sagrou-se Presidente da República.
Uma vez eleitos, esses novos líderes iniciaram seus mandatos propondo novas soluções e tentando entregar a principal promessa de suas campanhas: a ruptura. Porém, no decorrer dos dias, pouco se viu de mudança. Na Argentina, Macri tentou de imediato melhorar a economia de seu país cortando subsídios e pensando em reformas graduais, o resultado foi frustrante. O peso argentino se desvalorizou rapidamente, as reformas não passaram no congresso e a população logo castigou seu presidente. Nos EUA, Trump criou inimizades com sua postura radical e negacionista durante a pandemia e viu sua popularidade derreter. No Brasil, tanto Dória quanto Bolsonaro tentaram iniciativas modernas e diferentes, mas rapidamente e com a COVID-19 se entregaram para o populismo e as forças políticas mais tradicionais. Da mesma forma que chegaram ao poder de maneira muito semelhante, esses políticos também frustraram seus respectivos eleitores na mesma dose, sendo por discursos radicais (caso de Trump e Bolsonaro) ou pela entrega às forças políticas tradicionais (Macri e Dória). Em praticamente todos os casos, o que se viu ao longo de seus mandatos foi pouca mudança concreta perto do que se havia prometido em campanha.
Portanto, assim como suas ascensões ocorreram semelhantes, as quedas também, a iniciar pelo argentino. Maurício Macri foi derrotado na eleição presidencial de 2019 por uma frente comandada por Alberto Fernandez e Cristina Kirchner. Um dado interessante desta eleição é que Fernandez, apesar de peronista, se mostrou diversas vezes um crítico público dos governos de Cristina e, mesmo assim, se uniram em uma frente contra o incumbente Macri. Nos EUA, Trump foi derrotado por Joe Biden, antigo vice presidente de Barack Obama em uma eleição marcada pela descrença do sistema eleitoral e a invasão do Capitólio por extremistas. No Brasil, João Dória percebendo sua falta de apoio da população sequer tentou se reeleger Governador de São Paulo ou Presidente, e Jair Bolsonaro foi derrotado por Lula da Silva e Geraldo Alckmin. A eleição presidencial brasileira pode ser considerada uma mistura da argentina com a americana, houve uma frente ampla de antigos adversários políticos, com críticas ao sistema eleitoral e manifestações extremistas após o resultado do pleito, culminando na invasão e depredação do Palácio do Planalto, Congresso Nacional e STF.
A tendência mostra-se nítida quando analisada em um espectro mais amplo. O discurso de ruptura se fortaleceu e foi dominante durante 1 ciclo eleitoral, finalizando-se com a eleição presidencial brasileira em 2018. A queda destes políticos se deu no ciclo seguinte de maneira semelhante em suas regiões e pelo mesmo Jair Bolsonaro que foi o último a ser eleito finalizou o período de políticos antiestablishment no poder em 2022. Outro ponto a se destacar é que em 2020, além da derrota de Donald Trump, houve o ciclo eleitoral municipal no Brasil. E já nesta ocasião, se viu o retorno dos políticos mais tradicionais em detrimento dos outsiders com a vitória de Bruno Covas sobre Guilherme Boulos em São Paulo e o retorno de Eduardo Paes no Rio de Janeiro. Desta forma, com a mesma velocidade que esses “não-políticos” ascenderam ao poder, eles foram retirados. No entanto, a pergunta que resta é: o que se pode esperar nos próximos anos?
É preciso primeiro entender que os vencedores do último ciclo eleitoral obtiveram sucesso não por seus projetos e, sim, pela rejeição do adversário. A baixa popularidade de Alberto Fernandez na Argentina exemplifica bastante esse fenômeno. Quando eleito, o hermano retornou com grande parte das políticas populistas que Macri havia cortado e isso levou a um agravamento da situação econômica do país. A crise é tão severa que a inflação oficial beira 1.000% a.a. e a diferença entre o câmbio paralelo e o oficial é de quase 5 vezes. A conclusão é simples, os políticos tradicionais não podem insistir nas velhas soluções para problemas novos. Os primeiros dias do governo Lula 3 têm mostrado que o brasileiro não observou tão atentamente a situação de seu vizinho. Grande parte dos ministros escolhidos são políticos antigos com discursos ultrapassados e o retorno de políticas públicas ineficazes está cada vez mais evidente. Assim como Bolsonaro incorreu em parte dos erros de Macri, aparentemente Lula repetirá os de Fernandez.
Outro destaque é a eleição argentina que ocorrerá em 2023. Ao que tudo indica, dificilmente Fernandez conseguirá a reeleição e é esperado que um novo governo ascenda ao poder na Casa Rosada. Esse resultado pode não impactar diretamente a nossa realidade no Brasil, mas como se viu nos últimos anos, as decisões políticas tendem a ocorrer em uma tendência e efeito manada. O resultado de nossos Hermanos em 2023 e, posteriormente, o americano e o municipal em 2024 certamente darão grandes indicativos do que se esperar em 2026.
O governo Lula 3 apenas começou e certamente ainda é muito cedo para qualquer análise, no entanto o caminho tomado até aqui tem validado cada vez mais um provérbio famoso: “a história não se repete, mas frequentemente rima”.
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Publicado por
Gabriel Diniz Junqueira
Partner & Investment Analyst at Santa Fé Investimentos