CARREFOUR BRASIL: BOICOTE DE FRIGORÍFICOS
Nos últimos dias, o Carrefour Brasil enfrentou uma turbulência devido ao comunicado do CEO global do Carrefour, Alexandre Bompard, publicado em suas redes sociais no dia 20/11. Em uma carta endereçada ao presidente da FNSEA (Federação Nacional dos Sindicatos de Agricultores) da França, o executivo afirmou que, “em solidariedade ao setor agrícola, o Carrefour se compromete a não vender carne proveniente do Mercosul”, bloco que inclui Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. Ele também mencionou que esperava que outras empresas adotassem a mesma postura.
No dia seguinte, 21/11, o Grupo Les Mousquetaires, proprietário das redes de supermercados francesas Intermarché e Netto, aderiu ao boicote, anunciando que deixaria de comercializar carnes bovinas, suínas e de aves originárias da América do Sul, como forma de apoio ao setor agrícola francês.
A declaração de Bompard ocorreu no contexto do acordo de livre comércio Mercosul-União Europeia, assinado em 2019 e previsto para ser implementado em 6 de dezembro de 2024, na próxima reunião do Mercosul. O acordo provocou protestos na França na semana anterior, com fazendeiros bloqueando estradas e queimando equipamentos públicos para pressionar o governo francês. Agricultores temem a concorrência de produtos sul-americanos, que seriam mais baratos e, em alguns casos, não seguiriam as mesmas normas ambientais, gerando uma possível vantagem competitiva. Alexandre Bompard alertou que o acordo poderia “inundar” o mercado francês com carnes que “não respeitam as exigências e normas locais”. Diante das pressões, o presidente da França, Emmanuel Macron, declarou que o país não assinará o acordo.
Em resposta, o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) do Brasil publicou uma nota oficial contestando a posição de Alexandre Bompard. A nota destacou a qualidade e a sustentabilidade da agropecuária brasileira, mencionando o rigor de seu sistema de defesa agropecuária, reconhecido por 160 países, incluindo a União Europeia. Além disso, o Brasil reforçou seu compromisso com modelos de rastreabilidade alinhados ao EUDR (European Union Deforestation Regulation – Regulamento de Desmatamento da União Europeia) e lamentou declarações protecionistas que, segundo o Mapa, desinformam consumidores sem embasamento técnico.
A controvérsia ganhou proporções ainda maiores quando cerca de 40 frigoríficos brasileiros, incluindo JBS, Marfrig e Masterboi, interromperam o fornecimento de carne ao Carrefour Brasil na última quinta-feira (21/11). Essa decisão contou com o apoio do ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, e de deputados. A JBS, por exemplo, responde por aproximadamente 80% das carnes vendidas no Carrefour. A interrupção gerou preocupações, dado o alto giro de estoque das carnes in natura. Apesar de representarem cerca de 5% das vendas totais, a falta desses produtos poderia impactar o tráfego nas lojas, já que os consumidores podem optar por realizar todas as suas compras em concorrentes, especialmente em um período marcado pela alta inflação nos alimentos e pelas promoções da Black Friday.
O Carrefour Brasil reconheceu o impacto da medida e informou que, no dia 21/11, houve desabastecimento de cortes bovinos em algumas lojas da bandeira Atacadão. Contudo, nas lojas do segmento de varejo e no Sam’s Club, os níveis de ruptura permaneceram dentro dos padrões normais.
Ficou evidente que a declaração do CEO global causou danos ao mercado brasileiro, o segundo maior em faturamento e rentabilidade para o grupo Carrefour.
Na terça-feira (26/11), Alexandre Bompard enviou uma carta de desculpas ao ministro Carlos Fávaro, esclarecendo possíveis mal-entendidos. Ele reafirmou a qualidade e importância da carne brasileira, explicando que o Carrefour compra carnes quase exclusivamente de produtores franceses para venda na França e de pecuaristas brasileiros para venda no Brasil. Segundo ele, a decisão do Carrefour França visava apenas apoiar agricultores franceses em crise, sem intenção de prejudicar mercados externos.
Com a carta, os principais frigoríficos brasileiros decidiram suspender o boicote. O Atacadão informou que o cronograma de entregas de carnes bovinas foi retomado e espera normalizar o abastecimento nos próximos dias.
Publicado por:
Rodrigo Pontes de Miranda Lopes de Farias
Partner & Investment Analyst at Santa Fé Investimentos