No último dia 13 de março, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, que as Tarifas de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e Distribuição (TUSD) devem ser consideradas na composição da base de cálculo do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). A decisão do STJ foi pautada numa decisão majoritária do STF, de fevereiro do ano passado, que entendeu pela inconstitucionalidade do artigo da Lei Complementar (LC) 194/2022 que excluía expressamente a inclusão das tarifas da base de cálculo do ICMS, e trata do período anterior à edição da Lei. Como resultado, os estados devem se livrar de um impacto financeiro estimado em 30 bilhões de reais anualmente, segundo projeção do Comitê Nacional dos Secretários de Fazenda (COMSEFAZ).
Os ministros do STJ acompanharam o voto do relator, ministro Herman Benjamin, que afirmou que o sistema elétrico tem etapas interdependentes, em que a supressão de qualquer das partes inviabiliza o consumo: “O Sistema Nacional de Energia Elétrica abrange diversas etapas interdependentes, conexas entre si, como a geração e produção, ou mesmo a importação, a transmissão e a distribuição. Para a constatação da interdependência, basta cogitar-se a supressão de qualquer uma das etapas, que será possível concluir que inexiste a possibilidade física material do consumo da energia elétrica”. O relator afirmou também que, uma vez que a TUST e a TUSD são repassadas ao consumidor final, livre ou cativo, ao serem incluídas na conta de energia, então elas compõem o valor total da operação para fins de formação da base de cálculo do ICMS.
O assunto é discutido no STJ como repetitivo (tema 986), o que significa que a tese será de aplicação obrigatória pelos demais tribunais (com exceção do Supremo Tribunal Federal – STF), que estavam com ações suspensas aguardando a definição, pelo STJ, do precedente qualificado. O colegiado aproveitou para modular os efeitos da decisão, estabelecendo como marco o julgamento, pela Primeira Turma do STJ, do Recurso Especial (REsp) 1.163.020, uma vez que, até esse momento, a orientação das turmas de direito público do STJ era favorável aos contribuintes. Foram mantidos, com algumas exceções, os efeitos de decisões liminares que beneficiaram os consumidores até a data da publicação do acórdão do julgamento da Primeira Turma, 27 de março de 2017. Entretanto, mesmo nesses casos, os contribuintes deverão passar a ter inclusas as tarifas na base de cálculo do ICMS a partir da publicação do acórdão do Tema Repetitivo 986.
Segundo o advogado Heleno Taveira Torres, representante de uma das partes, ainda há espaço para discussão sobre a TUST e a TUSD na base de cálculo do ICMS no âmbito do STF. “Acredito que os contribuintes irão atrás de seus direitos. Entendemos que a LC 194 fez essa exclusão [das tarifas da base do ICMS] e tem caráter interpretativo, ou seja, se aplica a fatos passados”, mas que, no momento, “respeita e acata” a decisão do STJ. Por outro lado, diretor institucional do COMSEFAZ, André Horta, considerou a decisão acertada.
Na prática, o julgamento deve impactar pouco ou nada a conta do consumidor. Isso porque muitos estados mantiveram a cobrança do ICMS normalmente e, desde fevereiro do ano passado, o artigo da Lei Complementar 194/2022 que retirava as tarifas da base de cálculo está suspenso, por meio de medida cautelar concedida pelo ministro Luiz Fux, até que o STF termine de apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 7195, ajuizada por 11 estados e o Distrito Federal contra a Lei Complementar. A decisão do STJ, no entanto, dá força à tese defendida pelos estados e deve trazer alívio para as secretarias de fazenda. Com esse resultado, parece improvável que o STF julgue a ADI 7195 em favor dos contribuintes. Uma derrota para o pagador de impostos, por enquanto.
Publicado por
Pedro Luis Figueiredo
Partner & Investment Analyst at Santa Fé Investimentos