PL 2703/2022 E O ADIAMENTO DO MARCO LEGAL DA GERAÇÃO DISTRIBUÍDA: ENTENDA A POLÊMICA.
Em 6 de janeiro de 2022 foi sancionada pelo Presidente Jair Bolsonaro a lei nº 14.300/2022, que ficou conhecida como Marco Legal da Geração Distribuída. Mas a lei, que prevê a manutenção direito adquirido para projetos protocolados até um ano após sua publicação, pode sofrer alterações. Isso porque tramita no Senado Federal o Projeto de Lei 2703, que prorroga em seis meses o prazo para manutenção dos direitos adquiridos – e altera a Lei 14.182 (Lei da privatização da Eletrobrás) para permitir a contratação de parcela da potência destinada à região Centro-Oeste [na lei 14.182] a partir de novas centrais hidrelétricas de até 50 MW.
Em Carta Aberta aos Senadores, entidades do setor elétrico, incluindo a Frente Nacional dos Consumidores (que engloba conselhos, associações e institutos relacionados ao setor) se posicionaram contrariamente ao projeto, alegando que, se aprovado, custaria cerca de 138 bilhões de reais, até 2045, aos consumidores do mercado cativo, penalizando, principalmente, os consumidores de menor renda. Isso porque, no regime atual, consumidores com unidades de Mini e Micro Geração Distribuída (MMGD) podem utilizar os créditos obtidos com a geração de energia elétrica para abater integralmente todas as tarifas e encargos da conta de luz. Entretanto, existe o encargo setorial CDE (Conta de Desenvolvimento Energético), que é pago por todos os consumidores por meio das Tarifas de Uso dos Sistemas de Transmissão (TUST) ou de Distribuição (TUSD). Dessa forma, os consumidores que têm condições financeiras de instalarem sistemas de MMGD ficam isentos de pagar as tarifas (subsidio implícito) deixando aos consumidores que não tem condições de migrar para a MMGD o ônus de financiar a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE).
Por outro lado, os defensores do PL 2703 alegam que a Aneel não cumpriu com o prazo para a regulamentação (i.e., editar as normas e resoluções técnicas que dispõe sobre o tema) da Lei nº 14.300 (que segundo o artigo 30 da lei era até 07/07/2022) e que, em função disso, as distribuidoras demoraram ou mesmo deixaram de realizar as adequações necessárias e implementações imediatas previstas, prejudicando o lado mais fraco da relação, o consumidor. É importante ressaltar que a Lei 14.300 já está em vigor, sendo que o prazo para protocolização de projetos com manutenção do direito adquirido foi ponto fundamental para o fechamento do acordo entre agentes do setor elétrico, Aneel e Ministério de Minas e Energia, que deu origem à Lei.
A falta de uma regulamentação clara para o setor, segundo as novas regras estabelecidas em lei, teria gerado inúmeras dificuldades na implementação de novos projetos de MMGD no último ano, de forma que a prorrogação do prazo seria apenas uma forma de ressarcir o consumidor do prazo inicial acordado.
Além disso, os apoiadores do projeto questionam a confiabilidade dos números apresentados pelas entidades do setor elétrico, apontando que os subsídios destinados a MMGD são muito inferiores, por exemplo, aos destinados à Cobertura dos custos de compra de combustível para termelétricas localizadas no Sistema Isolado (função da antiga Conta de Consumo de Combustíveis, incorporada à CDE em 2006), como pode ser visto no “Subsidômetro” da própria Aneel.
Figura 1: histórico dos subsídios do setor de energia elétrica. Fonte: Aneel.
Acessado em 19/12/2022
Por fim, é preciso prestar atenção a alguns pontos que quase não são citados nas discussões acerca do referido PL: A permissão da contratação de parcela da potência destinada à região Centro-Oeste [na lei da privatização da Eletrobrás] a partir de novas centrais hidrelétricas de até 50 MW e inclusão de pequenas centrais hidrelétricas (PCH) de até 30 MW no conceito de mini geração distribuída (o máximo para outras fontes é de 5MW), mantendo-se as isenções tarifarias para projetos desta natureza protocolados até 30 meses após a entrada em vigor da Lei 14.300, ou seja, até Julho/2024.
Inicialmente, quando foi enviado ao congresso, o projeto incluía apenas a prorrogação do prazo para protocolização de projetos com manutenção do direito adquirido, com o argumento de ressarcir o consumidor lesado pela demora, por parte da Aneel e das distribuidoras, em regulamentar e implementar as mudanças previstas na nova legislação. Estas adições seriam então consideradas os “Jabutis” do PL 2703 (termo usado para designar trechos incluídos em projetos de lei ou medidas provisórias que extrapolam o assunto original da proposta). E de fato, já existe, no Senado, emenda apresentada pela senadora Eliziane Gama (CIDADANIA/MA) pedindo a supressão desta parte do projeto, justificando que ela configuraria grave ameaça socioambiental à região, ao Cerrado e ao Pantanal. Como é citado pela senadora em sua justificativa, foi recentemente aprovada e transformada na Lei Estadual n.º 11.865/2022, projeto que proíbe a construção de pequenas centrais de hidrelétricas (PCHs) e usinas hidrelétricas (UHE) em toda a extensão do Rio Cuiabá, que é considerado um dos principais abastecedores do Pantanal.
De qualquer forma, cabe agora aos senadores dissertarem e decidirem sobre a aprovação ou não do projeto. Mas o prazo é curto. Uma decisão, seja ela qual for, deve ser tomada ainda este ano, ou no máximo na primeira semana de 2023. A nós, na condição de eleitores e investidores, cabe apenas acompanhar o desfecho deste polêmico Projeto que dividiu as opiniões do setor e torcer para que o resultado traga segurança jurídica e investimentos para o mesmo.
Fonte: MegaWhat. Disponível em: https://megawhat.energy/verbetes/299/conta-de-desenvolvimento-energetico-cde
Fonte: MegaWhat. Disponível em: https://megawhat.energy/verbetes/299/conta-de-desenvolvimento-energetico-cde
Lei 14.182 (Eletrobras) disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/Lei/L14182.htm
Lei 14.300 (Marco legal da GD) disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2022/lei/l14300.htm
PL 2703 no senado disponível em: https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/155372
Publicado por
Pedro Luis Figueiredo
Partner & Investment Analyst at Santa Fé Investimentos