UM ANO APÓS A TRAGÉDIA NO RS: COMO O SETOR DE SEGUROS FOI IMPACTADO?

Em 2024, o setor de seguros foi profundamente impactado no Rio Grande do Sul, que enfrentou uma das piores crises climáticas de sua história, com enchentes devastadoras que afetaram diversas cidades e comunidades.
As chuvas torrenciais, que começaram em março e se intensificaram ao longo do mês seguinte, resultaram em alagamentos generalizados, destruição de infraestrutura e perda de vidas.
Em balanço divulgado pela Defesa Civil do estado, as chuvas impactaram 478 municípios (96% do total), com milhares de pessoas deslocadas e danos materiais que superam os 100 bilhões de reais.
Impacto do desastre no setor de seguros
Este cenário catastrófico não apenas impactou diretamente a vida dos cidadãos, mas também teve repercussões significativas no setor de seguros, que se viu diante do maior sinistro climático da história do país.
Nos dias que se seguiram ao desastre, as seguradoras enfrentaram um aumento substancial nas reclamações de indenizações, com muitos segurados buscando compensações pelos danos.
O volume de sinistros disparou, alcançando cerca de 58 mil avisos de sinistro relacionados às enchentes, e resultando em aproximadamente R$ 6 bilhões em indenizações pagas ou provisionadas.
Pressão sobre as reservas financeiras das seguradoras
O setor de seguros que opera na região teve que mobilizar recursos consideráveis para atender a essa altíssima demanda por indenizações, o que, em muitos casos, resultou em uma pressão sobre suas reservas financeiras.
A capacidade de honrar os compromissos assumidos com os segurados tornou-se uma preocupação central e a necessidade de uma resposta rápida e precisa aos danos se tornou crítica.
Além disso, a tragédia também escancarou a escassa adesão aos seguros no Brasil e a crescente fragilidade do setor diante das consequências da crise climática: somente cerca de 10% dos imóveis impactados pelas enchentes possuíam alguma forma de proteção.
Em entrevista, Marcos Falcão, presidente do IRB (Re), a maior resseguradora do país, diz que
“Temos uma sociedade extremamente desprotegida. Além das perdas humanas, é claro, é uma tristeza pensar que, dos R$ 100 bilhões de prejuízos econômicos provocados pelas enchentes, menos de R$ 10 bilhões estavam segurados”.
A recuperação do setor de seguros no Rio Grande do Sul
Um ano após a tragédia, a contratação de seguros no Rio Grande do Sul aumentou significativamente. Nos produtos de proteção para condomínios, houve um crescimento de 47% até fevereiro deste ano, ficando abaixo apenas da demanda por seguro habitacional, que aumentou 52%.
Nas linhas de seguros empresariais, o avanço foi de 27%, de acordo com dados compilados pela Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg). As seguradoras também relatam um aumento na busca por cobertura específica contra alagamentos, tanto para automóveis quanto para imóveis. No entanto, o nível de cobertura dos seguros no RS segue baixo, como é no restante do país.
Dyogo Oliveira, presidente da Cnseg, em entrevista para o jornal Valor Econômico afirma que o Brasil não pode mais adiar o planejamento para enfrentar tragédias climáticas.
“O Estado não está preparado para essas situações e não tem uma estrutura pronta para reagir. A sociedade brasileira é muito propensa ao risco e o país precisa assegurar alguma garantia”, afirma. “A própria infraestrutura do Estado não tem seguro, o que representa um risco altíssimo hoje em dia.”
Reavaliação das estratégias de risco pelo setor de seguros
As seguradoras, que tradicionalmente operam em um ambiente de riscos calculados, precisam agora reavaliar suas exposições e estratégias de gerenciamento de risco. As enchentes do Rio Grande do Sul demonstram a magnitude que prejuízos causados por grandes desastres naturais podem alcançar, assim como os desafios operacionais que surgem neste tipo de evento. Segundo Oliveira:
“Coisas simples e óbvias não funcionam nesses momentos. Não dá para, por exemplo, exigir documentos pessoais ou contratos que estavam embaixo d’água. É preciso diminuir a burocracia e buscar outras maneiras de garantir que os clientes serão atendidos”.
O setor agora busca investir em tecnologias de previsão e monitoramento de riscos climáticos, buscando melhorar sua capacidade de resposta a desastres naturais. A colaboração com órgãos governamentais e instituições acadêmicas, que produzem conhecimento científico sobre as mudanças climáticas, também se tornaram prioridades, com o objetivo de mitigar os impactos de futuras enchentes e outros desastres naturais.
“É fundamental transformar ações isoladas em uma agenda organizada”, resume Oliveira.
O futuro do setor de seguros em regiões de risco
O receio das seguradoras é que certas regiões do país se tornem “inseguráveis”, ou seja, os incidentes são tão frequentes e tão severos que já não é mais uma questão de risco, mas sim de tempo até o próximo desastre, sendo impossível dimensionar o tamanho do prejuízo e precificá-lo de forma viável.
Este cenário, segundo Oliveira, já ocorre em algumas partes da Califórnia e da Flórida, nos Estados Unidos, onde várias seguradoras pararam de oferecer seguros residenciais devido ao aumento dos incêndios florestais e furacões.
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Publicado por
Pedro Luis Figueiredo
Partner & Investment Analyst at Santa Fé Investimentos