Em tempos onde a palavra de ordem é “empoderamento feminino”, compartilho uma experiência vivida, por mim, há menos de 10 dias.
Na semana passada estive em um parceiro da Santa Fé, umas das maiores e mais contemporâneas empresas do mercado financeiro. Fomos convidados para um café da manhã com foco em “trocas de vivências e experiências” entre Gestoras e Multi Family Offices.
Tirando o fato de que levei 60 minutos para atravessar menos de 2km no Itaim em São Paulo, avaliei o encontro como muito positivo. Realmente, entre um pão de queijo e um cafezinho, troquei cartões e experiências. Mas sabe o curioso? Essa troca ocorreu essencialmente com homens. Pasmem… eu era a ÚNICA mulher presente como convidada. No total éramos 3, eu e as 2 anfitriãs.
Trouxe este tema, pois fui convocada a escrever sobre o “dia da mulher” e nossa representatividade no mercado financeiro. Achei bastante significativa a situação com que me deparava: eu, a única mulher convidada presente em uma sala com aproximadamente 30 homens para em apenas 1 dia entre os 364 do ano exibir competências de mulher em discussões no Mercado Financeiro. Realidades e desafios que só uma mulher consegue equilibrar e conquistar com sucesso!
Então vamos aos fatos:
O 8 de março remete à primeira grande passeata de mulheres na Rússia, em 1917, que protestavam contra a fome que passavam; pelo final da 1º Guerra Mundial, além de por melhores condições de trabalho. Apenas em 1975 a ONU oficializou a data como feriado mundial, representando as conquistas femininas na sociedade.
É verdade que houve uma grande evolução no tema de igualdade de gênero, de 1917 para cá: direito a voto para eleição de governantes; melhores condições salariais e de jornada de trabalho; maior representatividade em atividades profissionais, até então predominantemente masculinas como na medicina, na política, nos esportes e também no mundo das finanças. …mas voltando à realidade da semana passada: eu era a ÚNICA mulher em uma sala com mais de 30 homens! Isso diz muito… me impactou!
Sou a quarta filha, única menina. Cresci em um ambiente masculino e sempre busquei encontrar o meu lugar como igual. Construí minha carreira em marketing e criatividade em que a presença feminina vem sendo bem mais atuante, assim como a diversidade em geral e quando entrei para o mercado financeiro realmente me deparei com um universo diferente.
Vejam no gráfico abaixo, retirado do Valor Econômico em fevereiro de 2023, mostrando que o percentual de mulheres no comando de empresas financeiras é bastante baixo, menos de 40%, e em algumas empresas não chega a 15%!
Esta realidade, além de triste, é extremamente prejudicial para o desenvolvimento do mercado, uma vez que limita o universo de trocas de experiências e restringe o aprimoramento de ideias e pontos de vista. Um ambiente diverso, é rico em criatividade e aprendizado. As relações cotidianas se tornam mais empáticas, o que deixa o ambiente de trabalho mais agradável, envolvente e produtivo. Certamente esta realidade gera produtividade e mais rentabilidade no final do dia, percentuais altamente considerados e tão bem analisados pelas casas de investimento, não é mesmo?
Já na outra ponta do mercado financeiro, quando olhamos para o número de investidoras, a situação já pinta um pouco diferente. Percebe-se que as mulheres buscam se fazer presentes; planejam, pensam em seu futuro e no de sua família. Acredito que esta realidade também reflete o poder feminino dentro de um lar. Pesquisas mostram que o poder de decisão de compra, agora, está preponderantemente nas mãos das mulheres. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o percentual de domicílios chefiados por mulheres no país dobrou nos últimos 25 anos, saltando de 25% em 1995 para 50% em 2020.
Na indústria da comunicação é sabido: as mulheres são as grandes responsáveis pelas principais decisões de compras da família: carro, casa, viagens. Parece que o mesmo pode vir a acontecer também com as finanças familiares.
Analisando o gráfico acima, usando a linguagem do “financês”, vemos um “upside” tanto para o mercado de investimentos com um todo, quanto para a representatividade feminina nele. Eu, como comercial que sou, vejo aqui uma grande oportunidade para se criar um diálogo entre minhas pares e buscar, nessa visão feminina, um belo nicho de crescimento para a captação de recursos para investimento.
Para finalizar sem polemizar ainda mais, não é minha intenção atacar com um discurso feminista, ou levantar a bandeira pela igualdade de gênero a todo custo. Só quero deixar o questionamento no ar e trazer a realidade à tona.
Um ambiente diverso, naturalmente, é um local de trocas, de crescimento e de fortalecimento do mercado. O rico mundo das finanças só tem a ganhar com mais olhares femininos, mais sensibilidade e empatia. Certamente as “trocas de experiências” provocadas no café da manhã da semana passada teriam sido ainda mais valiosas. Vale pensar, vela agir, vale fazer diferente!
Uma questão cultural? Sim. Mas é preciso mudar. Como? Fica aqui a reflexão.
Publicado por
Fernanda Lancellotti
Partner & Head of Investor Relations at Santa Fé Investimentos