TRANSFORMANDO O AÇO “MAIS VERDE”

O tema da descarbonização vem sendo amplamente debatido de forma global em todos os
setores da economia há alguns anos. A busca pela sustentabilidade das atividades e no
entorno das empresas se torna cada vez mais essencial para a perpetuidade das mesmas.

Monitoramento e metas para redução da emissão de Gases de Efeito Estufa (GEE) têm sido
condicionantes cada vez mais frequentes por parte dos investidores. Classificam-se em
emissões de escopo 1 (resultado direto das operações da empresa), escopo 2 (emissões
indiretas provenientes da energia adquirida para uso da própria companhia) e escopo 3
(emissões que ocorrem na cadeia de valor da empresa).

Toda essa preocupação não surgiu à toa. O aquecimento global se tornou um dos maiores
desafios da humanidade. Temperaturas recordes e fenômenos naturais potencializados pelo
aumento da concentração de gases de efeito estufa, já vem sendo observados ao redor do
mundo com maior frequência. De acordo com relatório produzido pela ONU (Organização das Nações Unidas) o mundo hoje caminha para um cenário de risco com um aumento médio da temperatura global de pelo menos 2,6°C até 2100. Para atingirmos um aumento de até 1,5°C seria necessário reduzir as emissões em 43% até 2030 e 60% em 2035, para chegar a zero em 2050.
O dióxido de carbono (CO2) é o principal detrator e compreende 75% das emissões de gases
de efeito estufa. O metano (CH4) e o óxido nitroso (N2O) representam praticamente todo o
restante.
A maioria das emissões de CO2 é proveniente do uso de combustíveis fósseis, especialmente para geração de eletricidade e calor, transporte, fabricação e consumo. Em 2022, as emissões de CO2 no mundo atingiram um recorde de 36,8 bilhões de toneladas, tendo um aumento de 0,9% em relação ao ano anterior, conforme Figura 1.

Figura 1: Emissões de CO2 (IEA 2023 – Internacional Energy Agency)

A China lidera o ranking de emissões de CO2 com cerca de 30% do volume global justificado ainda pelo uso intenso de combustíveis fósseis como carvão, petróleo e gás natural, conforme Figura 2.

Figura 2: Emissão de CO2 por países (ClimateWatch)

Apesar disso, a China vem adotando práticas para diminuir a exposição ao carbono. Um exemplo disso é o crescimento da frota de carros elétricos no país, atualmente 25% das vendas no país são de carros elétricos, o que representa 60% do total da venda global desse tipo de veículo. Esse movimento vem sendo conduzido por estratégias do governo chinês como subsídios e isenções ao consumidor e fabricantes desses veículos de energia limpa.

Tratando-se do Brasil, grandes companhias também têm se movimentado em direção a esse tema e traçado metas e estratégias para reduzir essa exposição ao carbono. Neste artigo iremos nos aprofundar nos trabalhos já desenvolvidos e nos planos da mineradora Vale.

A Vale, que na última década foi responsável por umas das maiores catástrofes ambientais da história do país em Mariana e Brumadinho, percebeu a urgência em adotar uma série de medidas para melhorar suas práticas e consequentes possíveis impactos ambientais.

Além de reforçar a segurança de todas as suas barragens, restaurar todas as áreas e comunidades afetadas pelos desastres e reforçar a governança, a companhia traçou metas relevantes com relação à emissão de carbono. A empresa se comprometeu a reduzir suas emissões líquidas de carbono (escopos 1 e 2) em 33% até 2030, como primeiro passo para se tornar uma empresa carbono zero em 2050. Da mesma forma, busca reduzir em 15% as suas emissões de escopo 3, relativas à cadeia de valor, até 2035.

Para reduzir as emissões diretas, a Vale vem estudando a adoção de combustíveis alternativos como a amônia verde para suas ferrovias e etanol para seus caminhões.  A empresa também vem utilizando a eletrificação para equipamentos de menor porte. No entanto, a maior parte das emissões está relacionada à sua cadeia de clientes na siderurgia. Esse setor é responsável por cerca de 8% das emissões de GEE no mundo. Então, visando contribuir com toda a cadeia de valor, a Vale anunciou recentemente o início dos testes com carga da primeira planta de briquete de minério de ferro do mundo, na unidade Tubarão em Vitória (ES), conforme Figura 3.

Figura 3: Unidade Tubarão (Vitória-ES)

O briquete é produzido a partir da aglomeração de minério de ferro de alta qualidade com uma solução tecnológica de aglomerantes a baixas temperaturas. Ele acaba sendo uma alternativa após um aperfeiçoamento das pelotas, já produzidas há bastante tempo pela Vale, também aglomerados de maior valor agregado. Esse produto vem sendo desenvolvido pela empresa há cerca de 20 anos no Centro Tecnológico de Ferrosos (CTF) em Nova Lima (MG). O briquete terá capacidade de reduzir em até 10% a emissão de GEE na produção do aço em relação ao processo tradicional de alto-forno porque elimina a etapa de sinterização, intensiva em emissão de carbono. Com isso, acaba aderindo à tendência da indústria siderúrgica, com a utilização da rota de redução direta, mais limpa do que a de alto-forno, pois utiliza gás natural em vez de coque. Além disso, irá reduzir a emissão do dióxido de enxofre (SOX) e do óxido de nitrogênio (NOX), como também dispensará o uso de água em sua fabricação.

O desenvolvimento desse produto é considerado um marco histórico para o setor da siderurgia, pois além da redução da emissão de carbono, também irá facilitar o processo de produção do aço com menos etapas e menor volume a ser movimentado, podendo ser observado na Figura 4.

Figura 4: Briquete de minério de ferro

O start-up completo da primeira planta de briquete em Tubarão está previsto para ocorrer ainda este ano e o da segunda planta no início de 2024, foram investidos no projeto cerca de R$ 1,2 bilhão. As duas unidades terão capacidades para produzir 6 milhões de toneladas por ano de briquete. A empresa pretende alcançar até 2030 cerca de 100 milhões de toneladas por ano em aglomerados de minério de ferro, entre pelotas e briquetes.

A companhia também vem estudando a construção e operação de hubs em regiões estratégicas, próximos a seus principais clientes em regiões da Arábia Saudita, Emirados Árabes, Omã, América do Norte e mesmo no Brasil. Esses complexos industriais deverão fornecer os aglomerados de minério de ferro como insumo para produção do hot briquetted iron (HBI), conhecido também como o “aço verde”.

Um dos acordos feitos foi com a H2 Green Steel, uma startup industrial sueca fundada em 2020 com intenção de descarbonizar a cadeia de valor do aço.

A Vale também assinou uma carta de intenções com o grupo siderúrgico indiano Essar, para o fornecimento de 4 milhões de toneladas por ano de aglomerados de minério de ferro (pelotas ou briquetes) para a rota de redução direta.

Percebe-se que a Vale está comprometida em seguir uma abordagem inovadora atendendo a agenda ESG sem deixar de focar em rentabilidade. Sendo pioneira nesse tipo de produto, a companhia se apresenta como uma referência no segmento. A tendência é que esse produto passe a negociar com um prêmio relevante em relação a seus pares, já que o briquete é mais sustentável e torna a produção de aço mais eficiente.

Alguns setores da economia ainda enfrentam dificuldades em realizar a descarbonização, seja pela natureza da operação, pela viabilidade econômica ou por falta de tecnologia atual necessária. Evidencia-se, assim, que qualquer mitigação do impacto ao meio ambiente deve ser vista de forma positiva. Dessa forma, entendemos que a Vale segue firme na trajetória de geração de valor, sempre inovadora obtendo expressivos ganhos de eficiência.

Publicado por

Ricardo Leite Franco Filho

Partner & Investment Analyst at Santa Fé Investimentos