UTILITIES: UM SETOR DEFENSIVO

A recente alta dos juros em escala global, ocasionada pela pressão inflacionária decorrente dos eventos mundo afora, fez as bolsas mundiais sofrerem e aumentou a procura por ativos resilientes de caráter protetivo. Uma classe de ativo muito utilizada foi a de títulos públicos que pagam IPCA+, ou seja, a inflação do período mais uma taxa pré-fixada. Entretanto essa não é a única forma de se proteger. Dentre os diferentes setores de atuação das empresas da Bolsa Brasileira, o setor de Utilities tem características que o tornam uma boa opção de defesa para a carteira.

Primeiramente, é importante entender quais empresas compõem o setor de Utilities. O setor é subdivido em quatros áreas de atuação: Geração de Energia; Transmissão Elétrica; Distribuição de Energia; Saneamento Básico. Na bolsa, existem empresas que atuam exclusivamente em um desses setores e outras que atuam em mais de um. Na tabela abaixo, estão listadas e classificadas, por área de atuação, algumas das empresas presentes na B3.

O foco deste texto será nas empresas ligadas a energia elétrica. Começando pelo setor de geração de energia, como o próprio nome diz, é responsável por gerar energia elétrica. Entre as diversas fontes de geração de energia no Brasil, a mais utilizada é a hidrelétrica (62%) que usa a força da água armazenada em reservatórios para acionar suas turbinas. Outras fontes utilizadas são a solar (3%), eólica (12%) e as térmicas (23%) que fazem uso do gás natural, biomassa, diesel, carvão ou reação nuclear como insumo para a geração.

A energia gerada tem duas formas de ser comercializada: no mercado regulado ou no mercado livre. O mercado regulado ainda é o ambiente onde o maior volume de energia é comercializado. Em 2021, 66% da energia gerada foi comercializada via mercado regulado, segundo a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), e toda contratação de energia para consumidor cativo (população) é feita através desse meio, via leilões públicos de capacidade. A empresa que ofertar a energia pelo menor preço (R$/MW) será vencedora. O preço da energia é reajustado anualmente pelo IPCA, o índice de preços no consumidor.

Por sua vez, o setor de transmissão tem como intuito conectar toda a rede elétrica do Brasil por meio do Sistema Interligado Nacional (SIN). Essa foi a maneira encontrada pela Aneel, a agência reguladora do setor elétrico, para evitar a falta de energia ou discrepâncias nos preços no território nacional, causadas pelas diferentes fontes de geração de energia. A composição do SIN é feita através de interligação de linhas de transmissão, que por sua vez, tem sua concessão leiloada para as empresas do setor.

A empresa ganhadora do leilão é aquela que ofertar o menor valor de RAP (receita anual permitida). A RAP, é o valor que a empresa está disposta a receber para manter aquela linha de transmissão em operação. Esse valor não depende do volume de energia transmitido e também é reajustado anualmente pela inflação do período (dependendo do ano que o leilão ocorreu pode ser indexado ao IPCA ou ao IGP-M).

Já o setor de distribuição é responsável pela distribuição e comercialização de energia elétrica, principalmente para a população. O setor funciona por meio de concessões regionais. As empresas que possuem o direito da concessão precisam cumprir os requisitos mínimos de qualidade, garantindo a toda população o acesso à energia elétrica com segurança e regularidade. As distribuidoras têm a sua receita atrelada à tarifa de energia paga pelos consumidores. Dentro dessa tarifa existe a parcela A e a parcela B. A parcela A compõe os custos que as distribuidoras não tem controle, por exemplo os custos de compra de energia e de transmissão. Já a parcela B, engloba os custos da distribuidora acrescidos de uma remuneração justa. A tarifa é revisada anualmente e pela inflação do período com algumas outras correções mais específicas da operação, como os ganhos de produtividade capturados pela companhia.

O caráter defensivo do setor se dá pelo repasse da inflação nas linhas de receita e pela previsibilidade do fluxo de caixa das empresas. Uma das razões que garante a estabilidade da receita é a baixa sensibilidade a fenômenos macroeconômicos. Esse fator pôde ser visto durante os meses mais intensos de lockdown, ocasionados pela pandemia, uma vez que a demanda por energia elétrica não demonstrou uma queda tão intensa, quando comparada com a demanda por produtos de outros setores. A questão climática é o fator que mais interfere no volume consumido, causando uma sazonalidade do consumo. Ainda assim, existe um crescimento no volume de energia consumido anualmente. O gráfico abaixo retrata as questões citadas acima.

Pelos motivos e características citadas acima, as companhias que atuam no setor elétrico apresentam um beta mais baixos do que as demais empresas. O beta é o fator que indica o quanto cada empresa tende a variar em relação ao índice Ibovespa. O que significa que, em momentos de baixa nas bolsas elas tendem a cair menos do que as outras empresas do mercado e consequentemente menos do que o Ibovespa. Logo o setor elétrico é visto como defensivo e conservador.

Publicado por
Pedro Suarez
Partner & Investment Analyst at Santa Fé Investimentos